sábado, 15 de outubro de 2011

Convivência Fatal (Martha Medeiros)


As razões pelas quais um relacionamento começa costuma ser as mesmas pelas quais ele termina. Não estou sendo original, muitos intelectuais já escreveram sobre isso, mas a gente continua achando que duas pessoas se unem e se separam por motivos grandiosos. Unem-se por causa de um amor avassalador e afastam-se por causa de uma briga avassaladora. Não é bem assim.  

A atração se dá por pequenos detalhes. O jeito dela sorrir que cria uma covinha do lado esquerdo do rosto. O jeito dele usar o boné virado para trás. A maneira de como ela se despede no telefone. A maneira como ele toca no cabelo dela. O fato de eles gostarem os mesmos filmes e odiarem a mesma música. A penugem loira do braço dela. A tatuagem no ombro dele. O jeito carinhoso sela com as amigas. Os poemas sensíveis que ele escreve. Pequenos retalhos de uma colcha que vai sendo costurada durante todo o relacionamento. Até que um dia fica pronta, aquece por um tempo e aí começa a esfriar.
Infidelidade, brigas e espancamentos costumam acelerar o fim, mas não são os verdadeiros culpados pela derrocada da relação.  São apenas conseqüências radicais daqueles pequenos desgastes que vão minando, em silêncio, a rotina doméstica. Ele não suporta a mania que ela tem de debulhar o milho no prato. Ela não suporta a mania dele ficar zapeando o controle remoto sem parar em canal algum. Ele acha ridícula a maneira de como ela amarra o cadarço do tênis. Ela detesta quando ele conjuga o verbo errado. Ele acha o perfume dela enjoativo. Ela acha  que ele escova os dentes com displicência. Ela não agüenta o ronco de urso dele. Ele queria que ela parasse de fumar. Ela queria que ele parasse de chegar atraso. Eles queriam mágica: que seus parceiros virassem outra pessoa, mantendo-se eles mesmo.
Solução? Se eu tivesse uma, não estaria aqui. Estaria rica. 

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